Comissão Pastoral da Terra
Coordenação da Campanha contra o Trabalho
Escravo
NOTA DA CPT/CAMPANHA NACIONAL DE OLHO ABERTO
PARA NÃO VIRAR ESCRAVO
Não ao trabalho escravo! Que seu sim seja
sim, que seu não seja não...
O Governador do Maranhão acaba de nomear como seu assessor especial na
Casa Civil, Camilo Figueiredo, ex-deputado e sócio de empresa da família,
flagrada em 2012 pelo Grupo Móvel de Fiscalização do Ministério do Trabalho,
com trabalhadores em regime de escravidão.
Em junho de 2013 a empresa - Líder Agropecuária - foi incluída na Lista
Suja do trabalho escravo.
Vindo de outro qualquer político, essa notícia seria infelizmente mais
uma triste confirmação da pouca consideração que parte das nossas elites
continua tendo para com o compromisso nacional de erradicar o trabalho escravo,
firmado em 2003 pelo Brasil.
Com trajetória respeitada na militância contra o trabalho escravo, o
antigo representante da Associação dos Juízes Federais na CONATRAE, Flávio
Dino, seria mais um governante a sacrificar princípios sagrados em nome da
oportunista “governabilidade” e da “real politik”?
Salvo por complicada ginástica argumentativa, não é possível justificar,
como tentou fazer a sua Secretaria de Comunicação Social[2]
Segundo informação dos fiscais que resgataram da sua fazenda sete
trabalhadores mantidos em condição análoga à de escravos, “a água consumida no
local era a mesma que a utilizada pelos animais da fazenda. Retirada de uma
lagoa suja, com girinos, ela era acondicionada em pequenos potes de barro e
consumida sem qualquer tratamento ou filtragem. Os empregados tomavam banho
nesta lagoa e, como não havia instalações sanitárias, utilizavam o mato como
banheiro. Os trabalhadores resgatados cuidavam da limpeza do pasto e ficavam
alojados em barracos feitos com palha, sem proteção lateral, e eram habitados
por famílias inteiras, incluindo crianças. Em noites de chuva, as redes onde
dormiam ficavam molhadas e todos sofriam com o frio”. Características típicas
de condições degradantes que, no ordenamento legal brasileiro, trazem a
qualificação jurídica de “condição análoga à de escravo”, de acordo com o
artigo 149 do Código Penal: quando a pessoa é tratada como coisa, pior que
animal.
Por este motivo, após um ano, tendo exercido seu direito ao
contraditório, o nome do responsável por esta prática foi incluído no “Cadastro
de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de
escravo”, conhecido como “Lista Suja do trabalho escravo”. Segundo a regra
deste Cadastro, criado em 2003, o nome fica dois anos na Lista até poder ser
retirado, tendo o empregador sanado os problemas, pago as pendências e não ter
apresentado reincidência no crime.
A nomeação de Camilo Figueiredo contradiz frontalmente o engajamento
explícito que o candidato Flávio Dino assumiu ao assinar, em 30 de setembro de
2014, a Carta-Compromisso contra o trabalho escravo, proposta pela CONATRAE a
todos os candidatos a cargo de governo. A mesma estipulava, in fine: “Garanto
que será prontamente exonerada qualquer pessoa que ocupe cargo público de
confiança sob minha responsabilidade que vier a se beneficiar desse tipo de mão
de obra.” A inclusão do nome da Líder Agropecuária na Lista Suja constitui
indicativo suficiente de que Camilo Figueiredo se beneficiou desse tipo de
prática. E sua nomeação em conhecimento de causa é claro sinal de ruptura do compromisso.
Não pode ser aceito o hipócrita argumento apresentado pelo Governo
maranhense de que “Camilo Figueiredo foi nomeado ‘após análise de todos os
requisitos legais’ (...). Não foi verificado qualquer impedimento previsto em
lei. [Pelo fato do servidor não constar em nenhuma lista de trabalho escravo],
é impossível a seus superiores hierárquicos aplicar sanções com base em fatos
ainda sem existência jurídica''. É notório que, desde o dia 27 de dezembro de
2014, pela decisão liminar tomada monocraticamente pelo Presidente do Supremo
Tribunal Federal, em pleno recesso do Judiciário e em pronto atendimento à
demanda de um lobby de construtoras, a ABRAINC[4]
Nessa altura, só não vê quem não quer ver.
A exemplo do BNDES e da Caixa Econômica, que já franquearam
financiamento aos incluídos na última lista suja conhecida (a de junho de 2014,
com mais de 600 nomes), o Governo do Maranhão já estaria tomando como caso
encerrado a supressão da Lista Suja, sem nem esperar a deliberação do STF nem
consultar o Ministério do Trabalho e Emprego a respeito? E Flávio Dino estaria
disposto a ratificar assim o desmantelamento programado da política nacional de
erradicação do trabalho escravo após 20 anos de corajosa construção?
Governador, não perca a oportunidade de, revendo a decisão questionada,
manifestar sua determinação política de defender e promover a política nacional
de erradicação do trabalho escravo hoje atacada em várias frentes.
Governador, que seu sim seja sim e que seu não seja não. O resto é
diabólico. (Mt, 5, 37)
Campanha Nacional da CPT contra o Trabalho Escravo
Goiânia, 06 de março de 2015.
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