Papa terá que enfrentar mito do
Concílio Vaticano 2º
MATEUS SOARES DE AZEVEDOESPECIAL PARA
A FOLHA
Da substância dos 16 documentos
elaborados durante o Concílio Vaticano 2º (1962-65) sobre uma variedade de
assuntos, entre os quais o ecumenismo e a relação do catolicismo com outras
religiões, pouco se conhece.
Tampouco são lembrados os encarniçados
debates, as numerosas sessões, a história de sua convocação por João 23 e de sua
conclusão, já sob a batuta de Paulo 6º.
Mas há rica e variada "mitologia"
envolvendo o evento. Confrontá-la será o principal desafio de
Francisco.
Tal mitologia sustenta que, antes do
Vaticano 2º, a igreja era uma instituição retrógrada, superada, mesmo
reacionária. O concílio teria sido uma lufada de ar fresco.
Mas, se a igreja tivesse sido esse
corpo fossilizado, como teria sobrevivido aos inúmeros desafios e confrontos que
a ameaçaram?
Se fosse tal como a descrevem,
certamente não teria sobrevivido ao fascismo, nem ao comunismo de Stálin,
tampouco ao liberalismo. A verdade é que os documentos do concílio não são
conhecidos senão de especialistas.
O Vaticano 2º se tornou como um
"bezerro de ouro" para muitos. Tornou-se tão sacrossanto que não pode ser
criticado ou questionado.
Os meros resultados quantitativos do
concílio, contudo, são desastrosos para a própria tradição que ele supostamente
veio renovar. Os números e a situação espiritual geral mostram que o projeto
fracassou.
Esperava-se uma "renovação", mas o que
se tem visto após meio século são secularização e dessacralização crescentes da
sociedade, abandono da fé por milhões, escândalos morais e corrupção
financeira.
Parafraseando Nelson Rodrigues, resta
saber o que Francisco fará para impedir que a América Latina logo se torne "o
maior continente ex-católico do mundo".
A primeira coisa é colocar a verdade
no lugar do mito do concílio.
MATEUS SOARES DE
AZEVEDO é mestre em história das religiões
pela USP
ESTADÃO – 20/03/2013
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