Não há
problema insolúvel quando um homem passa a suspeitar de que seja o próprio
Deus. Muitas vezes um comprimido tarja preta ou uma dose de semancol, que vem
em forma de topada no pé da cama, é suficiente. Mas o problema fica muito sério
quando o sujeito deixa a escala da suspeita e passa a ter certeza absoluta da
sua divindade. Aí a tendência é de que a vaca vá para o brejo. A vaca, o
rebanho, o pasto, a fazenda inteira. É o que ocorre com o juiz Sérgio Moro, que conduz o processo daLava Jato. O
caso da prisão da cunhada do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, é
emblemático. Ao ver num vídeo um mulher muito parecida com ela na fila de um
caixa eletrônico, o magistrado, do alto do seu achismo, corroborado por uma
promotoria também “achista”, decretou sua prisão. E disse que o vídeo provava que
ela fazia depósitos para a irmã de maneira pulverizada. Só Deus viria tanto em
tão pouco.
Marice
Correia de Lima estava no exterior, onde participava de um Congresso, quando
foi informada de que Moro queria
prendê-la. Retornou para se apresentar, se defender e esclarecer a dúvida do
juiz. Que dúvida se no seio de Deus só há certeza? Foi presa, claro. O MP pediu
ainda ampliação da prisão porque criminosa periculosa assim…. só atrás das
grades! Até que a verdadeira dona da imagem que aparece no vídeo, Giselda
Rousie de Lima, irmã de Marice, Mulher de Vaccari, é finalmente reconhecida.
Ela que já havia dito ser a pessoa que aparecia no vídeo: “esta pessoa sou EU!”
– mas foi ignorada. E ela disse mais: “eu estava movimentando a minha conta no
caixa eletrônico”. Mas Deus deu de ombros.Moro mandou soltar Marice. Apenas.
Sem maiores explicações, pedidos de desculpas ou qualquer coisa. “Deus”, como
se sabe, tem mais o que fazer. O magistrado Moro foi a estrela de um prêmio
inventado pelo jornal O Globo para bajular lideranças políticas de
direita que se dispõe a cumprir bem seu papel – atacar o PT. E, perto do
Olimpo, entendeu que era ele, ou deveria ser em definitivo, o protagonista
deste grande teatro em que se transforma a Lava-Jato. Na lista dos
beneficiários da grana das empresas que trabalhavam para a Petrobras existem
muitos partidos. Uma lista divulgada ontem em Conexão (leia aqui) mostra mais
de duas dezenas. Nela, além do PT, o PSDB (segundo beneficiário), PMDB, DEM, PR
e etc. Mas ao ler a lista percebe-se o quão parcial é a Justiça Divina imposta
pelo lugar tenente de Nosso Senhor aqui na Terra. Moro ignora outras legendas
na sua investigação. Seu alvo, sua meta, sua obsessão é o PT. E para isso ele
não mede esforços, não reconsidera decisões, não pede desculpas e nem redobra
cuidados. Moro está seguindo em marcha firme em direção ao abismo. Mas ouve a
ovação da plateia como se fosse um herói a se aproximar da linha de chegada –
cada um ouve o que quer. Quando cumprir seu papel, ou pedir aposentadoria, conforme
fez outro “Deus” há alguns meses, se achará pronto para alçar o mais alto posto
reservado aos dotados do dom da imortalidade. É um caminho possível. Mas a vida
e seus mistérios muitas vezes são impiedosos com a vaidade. Por vezes reserva
um forte aprendizado para aqueles que, se achando poderosos, subjugam,
tripudiam e atropelam no solo sagrado que é a vida de seu semelhante.
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